Minha casa, minha morte




Regressara a casa, mas a casa estava irreconhecível. Que tinha acontecido? As máquinas tinham sido levadas. As paredes, anteriormente brilhantes e sem manchas, estavam vandalizadas. Faltavam cadeiras na mesa de jantar. Onde estavam as cadeiras?... Na rua?... E porquê?... Porquê tantos estragos, tanta destruição?... As imaculadas portas lacadas de branco, todas riscadas e lascadas, as flores arrancadas, a roupa dos armários espalhada pelo chão, os lençóis rasgados, as loiças partidas... olhava tudo aquilo sem sequer poder verter uma lágrima. Porque cada coisa na delicada casa era um gesto, um gesto de pensamento, de tempo e de amor... Como reconstruir tudo aquilo? Quanto tempo? E o ânimo? Será que haveria ainda força e ânimo para recomeçar tudo de novo? Tudo de novo outra vez?... Ou haveria antes um insuperável cansaço e, para sempre, uma ausência de esperança?... Como parecia de repente tão agradável e suave a morte. Como parecia tão doce e suave poder não sentir, não pensar, não ter nenhuma ideia de futuro. Suave nada. Parecia de repente tão bom simplesmente uma coisa, essa coisa indistinta e suavíssima, sem consciência nem sensibilidade: poder desaparecer como pequena chama que ardesse no escuro e de súbito fosse soprada e consigo levasse a luz para sempre, para todo o sempre.