Sobre o esforço que implica voar


Afinal, éramos santos e podíamos voar, mas, apesar da nossa santidade, voar não era uma coisa fácil. Tínhamos por dentro uma espécie de motor que nem sempre funcionava. Esse motor fazia lembrar aqueles carros que quando não arrancam têm de ser empurrados. Assim era. Por cima da cidade em ruínas, por cima das casas em cinzas, nós voávamos, talvez para nos salvar. Salvar do quê?... Dos erros e de tantas tentativas goradas de alegria?... De sermos menos que essa promessa com que chegáramos à vida?... Voávamos com esforço, correndo com dor e um aperto na garganta, para tomar balanço. No meio da devastação, as minhas vestes eram longas, brilhantes, brancas e azuis, entre o céu e as nuvens, as minhas roupas eram tão suaves, brilhantes e fantásticas como as túnicas dos ícones que por vezes se vèem nos templos.