A impotência perante os outros

Sonho CCLVIII

Estava sentado numa mesa em frente de um pai. Mais adiante, mesmo à frente de uma janela, estava a filha de doze anos, uma criança que nos colocava, pelo seu temperamento e pela sua inteligência, enormes desafios.

Olhava, mas não podia acreditar que os movimentos que a criança fazia fossem aqueles que a levariam a saltar da janela.

O pai estava de costas, mais perto da janela e mais perto da criança do que eu, pois entre mim e a criança havia aquela mesa enorme e o pai.

Desatei aos gritos e pedi ao pai que agarrasse na filha, mas ele não se voltou.

Há realidades, entre os que se amam, que exigem forças descomunais para poderem ser vistas.

Corri como um louco, voando por cima da mesa, mas não cheguei a tempo de impedir a criança de saltar.

Forcei-me a olhar para baixo.

Miraculosamente, a criança mostrava que era como um gato. Caíra de pé. Mas vi, pela terrível expressão do seu olhar, que iria tentar lançar-se de uma janela mais alta.

Um estranho no meio do caos, um refém involuntário da angústia, como um lúcido entre cegos, assim fica quem é apanhado no meio de uma loucura comunitária por acaso, sem aviso prévio.