Sonho LXXVI
Afinal, a Maria do Mar tinha feito amor diversas vezes
com Biagio Yamaguti, e não apenas uma.
A Maria do Mar dizia-lhe: «Quanto mais depressa isto
acabar, melhor, que é para eu sofrer o menos possível, percebes?...»
Andavam sempre por sítios escuros e incrivelmente
desarrumados e num dos quartos em que faziam amor estava um guarda-chuva aberto
em cima de um reposteiro, o que não fazia qualquer sentido.
Porque haveria alguém de deixar um
guarda-chuva aberto em cima de um reposteiro?
Eis uma questão pertinente.
A Maria do Mar tentava explicar a Biagio Yamagutti que
ele era adicto ao sexo e ao jogo, mas Biagio Yamagutti não percebia o termo «adicto».
«Há vários tipos de adições.» Tentava explicar a
Maria do Mar. «Ao álcool. Às drogas. Ao sexo. Ao jogo. Ao trabalho. Às relações
amorosas. À comida. À falta de comida…»
Biagio Yamagutti não conseguia perceber, era como se
tivesse um grande muro dentro da cabeça.
A Maria do Mar tinha muita pena dele.
«Eu sei do que estou a falar porque sou
alcoólica!...»
Disse-lhe a Maria do Mar, num derradeiro esforço.
Ele ficou abismado. Ela sempre se disfarçara tão bem.
Passados uns minutos a Maria do Mar pôde porém observar
que ele percebera o que lhe dissera, não em relação a si mesmo, mas pelo menos
no que lhe dizia respeito, e, pela expressão do seu rosto, pôde ainda
perceber que Biagio Yamagutti estava a pensar que aquilo afinal fazia muito
sentido, uma vez que explicava muitas lacunas realmente
intrigantes no seu comportamento, ao longo dos últimos anos.
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René Magritte, «Hegel em Férias», 1958, óleo sobre tela, 50 cm x 70 cm, Colecção Privada |