Num futuro distante, talvez no século XXII, algo de terrível se passava.
À semelhança daquelas bonecas cujas cabeças se desmontam e são capazes de abrir e fechar os olhos, assim também as nossas cabeças se desmontavam e podiam trocar de corpo.
Atrás de cada cabeça, na nossa nuca, estava marcado o nome e o número do cartão de cidadão, para não dar azo a tragédias maiores.
A minha cabeça tinha sido colocada num outro corpo, o corpo de uma mulher que não era eu.
E eu dizia-lhe:
- Cuidado.
- Essa cabeça é minha.
- Esses pensamentos são meus.
- Esses pensamentos são meus.
- Não penses que são os teus pensamentos.
A mulher não se sentia capaz de viver com aquela cabeça, nem com aqueles pensamentos.
O seu desespero era de tal ordem, que estava prestes a suicidar-se.
O seu desespero era de tal ordem, que estava prestes a suicidar-se.
- Não pode ser!... - dizia eu, muito alarmada com aquela decisão.
- Olha, nada disso és tu. Tem calma. Espera um pouco. Tudo se há-de resolver. Vou tratar de tudo, para que tudo regresse à normalidade. Viver é uma oportunidade extraordinária!...
Não sei muito bem quem falava, uma vez que não tinha cabeça.
Tudo o que não queria era perder a minha cabeça.