Sobre a imensidão

Sonho CLXXXIX




De um barco à vela, tínhamos caído ao mar.

Nós os náufragos gritámos fortemente de modo a que o resto da tripulação nos ouvisse.

Tentámos nadar para perto do barco mas percebemos que uma corrente fortíssima nos levava, enquanto o vento levava o barco.

«Nada.» - Pensava eu. - «Somos menos que nada.»

Porque era tão ínfima a nossa força perante a força da corrente e tão avassaladora a nossa impotência.

Em menos de segundo, qualquer ideia de futuro se dissipou como uma voluta de fumo a confundir-se com o ar.

Num ápice, o barco desapareceu do nosso horizonte.

Como é imenso o mar!...

Como é imensa a terra!...

Atordoado, eu fazia contas à vida e à morte.

A morte seria dolorosa mas pelo menos rápida.

A vida, pelo contrário, parecia-me que ficava por viver. 

Tantos livros por ler!...

Tantos livros por escrever!...

Mais do que tudo o que me doía eram esses livros na hora da minha morte.

«Ainda não chegou a hora da nossa morte!...»

Gritou um dos meus companheiros de infortúnio, ao ver, no meio das vagas, um helicóptero.

«Aqui está um verdadeiro Deus ex machina.» - pensei eu, maravilhado com o som do helicóptero.

Depois disto, não dormiria durante três dias.

Tal era o píncaro de alegria em que me lançava a inesperada novidade de me saber dotado de uma hipótese de futuro, isto é, de uma vida.