Sinais de trânsito

Fragmento 60



Muitas vezes me comovem até às lágrimas as paisagens, mesmo as insignificantes. Lembro-me de Pessoa dizendo que um dia de sol o compensa de muito, no Livro do Desassossego. A mim, as cores compensam-me de muito, seja em que grau de luz for. Vou andando de noite dentro do carro pelas estradas e vejo os pontos de luz eléctrica a dançar no azul, à medida que deslizo. «Esplendor.» É o que penso. Porque até os sinais de trânsito, pregados como chupa-chupas coloridos à beira da estrada, me comovem. Têm qualquer coisa de gente, ali colocados, com as suas caras brilhantes e expressivas que se iluminam quando lhes bate a luz dos faróis. «Proibido ir a mais de cinquenta.» «Curva perigosa à esquerda.» «Atenção à passadeira.» «Esta rua tem sentido único.» «Stop.» Não há nada a fazer. Olho para eles e lembro-me espontaneamente de toda essa gente quase invisível que se esforça tanto por ser importante e por ser útil, fazendo com fé e dedicação todas as pequenas coisas com que acredita conquistar a alegria ou o amor.