Sobre um Lobisomem

Sonho CLXXVI
 
 
A Maria do Mar tinha de retirar duas ou três coisas de casa, mas o homem que chamou para realizar esse serviço não percebeu as instruções.
 
Ele encaixotou todo o recheio da casa, enquanto a Maria do Mar lhe dizia:
 
«Espere, você não está a perceber. Eu não vou mudar de casa.»
 
A Maria do Mar ao ver o lixo que estava atrás dos móveis sentiu a necessidade imperiosa de pegar numa pá e numa vassoura, mas não chegou a fazê-lo, pois o homem que lhe prestava aquele serviço começou a transformar-se em lobisomem.
 
No meio do átrio, a Maria do Mar tapou-o com uma manta para que não fosse levado pelas autoridades.
 
«O que se passa consigo? Está a transformar-se em lobisomem?»
 
«Sim.» - respondeu o homem. - «E sofro muito.»
 
Porém, quando a transformação se completou, o homem ficou enorme e pegou-lhe ao colo como se fosse uma pluma.
 
«Não.» - disse-lhe a Maria do Mar. - «Lá por seres um lobisomem, não podes fazer tudo o que te apetece.»
 
Mas já tinha acontecido.
 
Sempre e em vez do amor, o desejo rápido e desértico da pele, como um pobre paliativo ardente para uma eterna falta de ternura.